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O Poeta e a Ferrovia

Foto: Marden Sousa


A relação de Lívio Barreto com a ferrovia começa com o próprio limiar da Estrada de Ferro de Sobral, nascido em 1870, na fazenda de Angicos, Lívio e sua família se estabeleceram na cidade de Granja em 1878, ano dos estudos para implementação da obra. Sua infância na cidade e o seu crescimento foi concomitante ao da grande serpente de ferro, e durante toda sua vida ela esteve ou diante de seus olhos ou debaixo de seus pés, sendo uma confidente devota.

Suas viagens de trem eram recorrentes, na verdade, a vida de Lívio era uma fuga, que se fragmentava em outras: a fuga da profissão de caixeiro, do amor não correspondido, da realidade, da própria terra. Desde cedo partia para encontrar o paraíso poético idealizado, nunca encontrado efetivamente, diga-se. A primeira ida foi para o Pará, de onde voltou 4 anos depois desalentado e doente de beribéri, porém com conhecimento de autores portugueses e uma poesia mais amadurecida. Foi pela ferrovia que chegou até o vapor que o conduziria a Fortaleza da belle époque, lá travaria intimidade com os “novos do Ceará” e, com alguns deles, fundaria o revolucionário movimento literário da Padaria Espiritual. Também foi por esse trecho Granja-Camocim que transitou os manuscritos destinados ao prelo da sua única obra, Dolentes, aquela que seria considerada a expressão máxima do Simbolismo no Ceará.

O ramal Granja/Camocim do trem, antes do embarque no navio ou depois dele, poderia tanto ser um portal mágico das expectativas como a alameda do cemitério delas, dependendo da ocasião. Mas quando as viagens ficaram limitadas entre as duas cidades provincianas, quando as dificuldades da vida não lhe permitiram ultrapassar o porto, o desejo e a esperança de ir embora o cansou, o venceu, e contribuiu para sua morte precoce, aos 25 anos de idade, em seu último refúgio, Camocim.

E para arrematar, como a ferrovia parece sempre, de certa forma, fazer parte de momentos decisivos de Lívio, não nos censuraríamos imaginar que talvez tenha sido o trem que trouxe seu corpo de volta a Granja, selando de vez suas frustradas tentativas de fuga e fechando definitivamente a contextura entre a ferrovia e o poeta.

Créditos

Fotógrafo: Marden Sousa

Modelo: Matheus Andrade
Texto de: Edinailson Passos.

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